Senado Desafia STF e Votam Marco Temporal com Retrocessos para os Povos Indígenas

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Na manhã desta quarta-feira, 27 de setembro, a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado tomou uma decisão que acendeu o debate político no Brasil. O Projeto de Lei (PL) 2903/2023, que estabelece o marco temporal das terras indígenas, foi submetido a votação. Este movimento ocorreu no mesmo dia em que o Supremo Tribunal Federal (STF) estava analisando pontos que ficaram de fora da análise da tese jurídica, incluindo a questão da indenização a fazendeiros.

Por meio do PL 2903, senadores alinhados com o agronegócio propõem não apenas ressuscitar o marco temporal que foi derrubado pelo STF, mas também legitimar invasões de terras indígenas. Isso seria feito disponibilizando essas terras, sem consulta prévia às comunidades indígenas, para o agronegócio e grandes empreendimentos, como hidrelétricas, mineração, rodovias e ferrovias.

Entre os retrocessos mais alarmantes contidos no PL 2903 está a disposição que afirma que “não haverá qualquer limitação de uso e gozo aos não indígenas” que ocuparem terras indígenas “antes de concluído o processo demarcatório”. O projeto também assegura a permanência daqueles que avançarem sobre terras indígenas durante o processo de demarcação. Todas as construções feitas na área a ser demarcada seriam consideradas “de boa fé” e, portanto, passíveis de indenização.

Líderes indígenas enfatizam que a bancada ruralista desafia o STF ao defender o marco temporal, cuja inconstitucionalidade foi reconhecida pelo tribunal. Eles temem que o projeto seja aprovado no Senado, devido ao amplo apoio que recebeu do agronegócio. Após passar pela CCJ, a matéria seguirá para votação no plenário da Casa e, se aprovada, será encaminhada para a sanção presidencial.

“Energicamente, vejo o PL 2903 como uma salada de frutas. Pegaram todas as questões que ameaçam as vidas dos povos indígenas e as empurraram para tramitação sem discussão. Esperamos que o presidente Lula não sancione”, declarou Eliane Xunakalo, presidenta da Federação dos Povos e Organizações Indígenas do Mato Grosso (FEPOIMT).

Uma das preocupações centrais da FEPOIMT é que o PL 2903 possa acelerar a construção da Ferrogrão, um corredor ferroviário destinado ao transporte de milho e soja entre Sinop (MT) e Itaituba (PA), a fim de impulsionar a exportação de commodities agrícolas. A ausência de consulta prévia aos povos indígenas foi uma das irregularidades que levaram o STF a suspender a construção deste projeto.

O PL 2903 é uma versão do PL 490, aprovado pela Câmara em maio deste ano. No entanto, o texto original se torna ainda mais preocupante devido à incorporação de mais de 10 projetos de lei anexados, que propõem retrocessos ainda mais graves do que a tese jurídica declarada inconstitucional pelo STF.

Entre as maiores inquietações do Conselho Indígena de Roraima (CIR) está a proposta de expropriar territórios indígenas “devido à alteração dos traços culturais da comunidade ou por outros fatores decorrentes do tempo”, bem como a proibição de expandir terras indígenas. Roraima tem 23 terras com pedidos de ampliação e outras quatro em processo de demarcação.

A aprovação do PL 2903 também prejudicaria a ampliação das terras Araçá, Ponta da Serra, Aningal, Anaro e Serra da Moça, em Roraima, cujos territórios foram excluídos no processo de demarcação original.

A bancada ruralista, a maior do Congresso Nacional, intensificou sua oposição ao STF após a Corte invalidar o marco temporal das terras indígenas. Em uma entrevista coletiva recente, o líder da Frente Parlamentar Agrícola (FPA), deputado Pedro Lupion, declarou que “não é mais possível aceitar a expansão das atribuições do Judiciário” e acusou o STF de ter instituído a “barbárie” no campo.

José Medeiros (PL-MT), senador bolsonarista e representante dos latifundiários, prometeu que a bancada ruralista paralisará as votações no Congresso até que o marco temporal seja aprovado na Casa. Além disso, o senador Dr. Hiran (PP-RR) apresentou uma proposta de emenda à Constituição (PEC) que pede a instituição do marco temporal para a demarcação de terras indígenas.

A Advocacia-Geral da União (AGU) considerou o PL 2903 inconstitucional, apontando que o projeto estabelece condições em desacordo com o texto constitucional sobre o processo demarcatório. Essa controvérsia sobre quem tem a palavra final, o STF ou o Congresso, está longe de ser resolvida, criando uma tensão latente entre os poderes da República.

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