Na vastidão da Amazônia rondoniense, a Reserva Extrativista Jaci-Paraná, outrora um refúgio natural de seringueiros e coletores de castanhas, enfrenta uma crise avassaladora. Fazendeiros, madeireiros e grileiros invadem impiedosamente a área protegida, ameaçando a vida e a cultura dos poucos moradores legítimos.
Esses extrativistas, historicamente ligados à produção sustentável de borracha, castanhas e açaí, vivenciam um cotidiano de terror, à mercê de fazendeiros armados que utilizam a brutalidade como meio de dominação. Em suas vozes, ecoa o medo da morte iminente e a perda de seu lar ancestral.
Para um deles, o retorno à reserva significa um destino sombrio, marcado pela violência. Outro morador viu sua casa ser consumida pelas chamas como represália por resistir às invasões. A ação dos fazendeiros extrapola os limites da ilegalidade, incluindo extração de madeira, queimadas, desmatamento e abertura de estradas, tudo isso com o propósito de intimidar e avançar com a pecuária ilegal.
O relato de João, cujo nome é fictício para proteger sua identidade, destaca a angústia que permeia a vida desses extrativistas ameaçados de morte. Suas denúncias, submetidas às autoridades desde 2017, não encontraram eco. As forças de segurança, a Polícia Militar, a Polícia Civil e a Secretaria do Desenvolvimento Ambiental de Rondônia parecem incapazes de frear as invasões crescentes.
A Reserva Extrativista Jaci-Paraná é uma instituição estadual, gerida pelo governo de Rondônia, liderado pelo governador Marcos Rocha, alinhado com o bolsonarismo. O descaso das autoridades frente à violência perpetrada contra os extrativistas é alarmante, e organizações como a Defensoria Pública de Rondônia, o Conselho Nacional das Populações Extrativistas (CNS), o Memorial Chico Mendes e a Rede Popular de Direitos Humanos de Rondônia acompanham os casos.
A incapacidade de resposta eficaz às denúncias gera questionamentos quanto à conivência de setores do governo de Rondônia com a ocupação ilegal da reserva. Desde 2019, a Resex Jaci-Paraná figura constantemente entre as áreas de conservação mais desmatadas do país, revelando o flagrante desrespeito às leis ambientais.
A redução drástica da reserva em 90% por iniciativa do governador Marcos Rocha, aprovada pela Assembleia Legislativa em 2021, abriu caminho para o aumento vertiginoso do desmatamento na região. Essa medida, posteriormente considerada inconstitucional pelo Judiciário, concedeu ainda mais poder às milícias rurais e fortaleceu o cerco contra os extrativistas.
A história de João é emblemática, pois ele é descendente de seringueiros que chegaram à região na década de 40, durante a Segunda Guerra Mundial, para extrair borracha para os Estados Unidos. Hoje, fazendeiros controlam grande parte da área, com rebanhos que chegam a 180 mil cabeças de gado, enquanto os extrativistas lutam para sobreviver.
A luta dos extrativistas da Jaci-Paraná transcende a proteção da natureza, sendo um confronto contra a conivência e omissão das autoridades, bem como contra os interesses políticos ligados ao agronegócio e ao bolsonarismo. A pergunta que ecoa é se o governo de Rondônia aguardará que uma tragédia ocorra para tomar medidas efetivas. A violência e o desmatamento avançam, mas a resposta do Estado é incerta, deixando a Jaci-Paraná à mercê de interesses maiores.