Na pacata Santa Bárbara, no coração de Minas Gerais, a barragem CDS II da AngloGold Ashanti projeta sombras preocupantes sobre os moradores. Roseni Aparecida Ambrosio, residente local, compartilha a angústia de viver sob a constante ameaça de colapso, resultado do modelo predatório de mineração. Nos últimos dois anos, a sirene de alerta ecoou cinco vezes, desencadeando o terror entre as famílias. Em maio deste ano, uma trinca de mais de 300 metros na estrutura só acentuou os temores.
A barragem CDS II ostenta a classificação de alto risco pela Agência Nacional de Mineração (ANM), mas a realidade vivenciada por Roseni vai além do medo. A falta de informação sobre os riscos iminentes amplifica a vulnerabilidade das famílias nas proximidades desses gigantes de concreto e lama.
O cenário é sombrio, com 36 barragens em Minas Gerais classificadas em situação de emergência, três delas no nível III, o mais alarmante. A intensificação das mudanças climáticas e eventos extremos, segundo Juliana Deprá do Movimento Pela Soberania Popular na Mineração (MAM), acentua a apreensão em relação à segurança dessas estruturas.
“Vivemos um regime de chuvas completamente diferente do histórico. Chuvas fortes, em épocas inesperadas, colocam em risco a estabilidade das barragens. A confiança nos laudos das empresas, que fazem seu automonitoramento, é tênue,” avalia Juliana.
Contudo, a busca implacável pelo lucro persiste. A insistência em um modelo predatório, que sacrifica vidas em prol dos interesses das mineradoras, é denunciada por Juliana. “O modelo saqueia nossas riquezas, deixando apenas prejuízos para a população. O lucro centralizado deixa em segundo plano a vida e as necessidades da população,” destaca ela.
A conivência do governo de Romeu Zema é destacada pelos críticos. Acusado de flexibilizar leis ambientais, Zema, financiado por mineradoras, é visto como um defensor do modelo predatório. “Zema avança em empreendimentos sem debater os impactos, atropelando os direitos da população,” comenta Juliana.
As desigualdades sociais, uma cicatriz indelével do avanço minerário, são exemplificadas em Brumadinho, onde o rompimento da barragem da Vale em 2019 revelou a ligação entre mineração e concentração de renda. O Índice de Gini em Brumadinho, 0,58, supera a média estadual de 0,49, evidenciando a desigualdade econômica exacerbada pela exploração mineral.
Para Tadzio Coelho, coordenador do Grupo de Pesquisa e Extensão Mineração e Alternativas (Minas) da Universidade Federal de Viçosa (UFV), as cidades mineradas em Minas Gerais perpetuam esse padrão de desigualdade. “O modelo de mineração amplia as desigualdades de renda, gerando precarização no trabalho e altos salários para poucos nos cargos de direção,” explica o pesquisador.